9 de jan. de 2012

Brasil avançou na inovação tecnológica em 2011

Site Inovação Tecnológica
Guilherme Gorgulho - Inovação Unicamp

Acelerar a inovação

Há um sentido de urgência que permeia o discurso do presidente da Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Inovadoras (Anpei), Carlos Calmanovici.

Representante de mais de 200 empresas e entidades orientadas a P&D no segmento produtivo - a maioria delas de grande porte e de capital nacional -, a Anpei considera que 2011 foi um ano positivo, de conquistas, mas há uma grande necessidade de se acelerar a implementação de políticas e ações de fomento para que o Brasil não perca a disputa pela competitividade.

"O principal ponto de destaque para mim é a questão da velocidade, nós temos que fazer tudo isso que estamos fazendo de uma forma mais rápida, porque os outros estão fazendo mais rápido do que nós", considerou o engenheiro químico Calmanovici, que também é diretor de Inovação e Tecnologia da ETH Bioenergia.

Em um ano em que o Ministério da Ciência e Tecnologia incorporou a Inovação ao nome e às prioridades da pasta, em que foi anunciada a criação da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii), em que foi lançado o programa Ciência sem Fronteiras para qualificar recursos humanos e em que a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) iniciou um estudo para crescer e se transformar em uma instituição financeira, a bússola parece estar apontando para o lado certo, mas o acelerador precisa ir mais a fundo para que o Brasil realmente concorra em condições de igualdade na corrida da inovação, de acordo com a Anpei.

"Nós temos nossas dificuldades [para inovar], temos todas as justificativas que são razoáveis, que temos que entender, mas se nós não fizermos alguém vai fazer; e se nós fizermos alguém pode fazer também, mas nós podemos brigar e temos como fazer isso", afirma Calmanovici.


Banco da inovação

No dia 9 de dezembro, a Anpei realizou a última reunião do ano de seu Conselho Superior, que contou com as presenças do ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Aloizio Mercadante, e do secretário-executivo da pasta, Luiz Antonio Rodrigues Elias, para fazer um balanço das atividades e abordar os planos para 2012.

Para a entidade que representa as empresas inovadoras, um dos avanços principais foi a mudança de foco da Finep, que passou a apoiar mais as iniciativas empresariais. O tamanho da carteira de pedidos de crédito para a inovação da Finep aumentou em quase cinco vezes desde o início do ano, alcançando no final de 2011 a marca de R$ 9,13 bilhões. Além disso, o total de recursos liberados cresceu 56% em relação a 2010, chegando a R$ 1,87 bilhão.

Nesta entrevista, o presidente da Anpei avalia as mudanças na agência ligada ao MCTI, faz um balanço sobre como foi o ano e aponta quais temas requerem uma atenção especial para o ano que se inicia.

Como foi o ano de 2011 para a inovação no Brasil sob o ponto de vista da Anpei?

A Anpei vê 2011 efetivamente como um ano de avanços, houve avanços significativos. Do ponto de vista de recursos, o orçamento da inovação cresceu. Nós percebemos que houve um comprometimento maior entre todos os atores, inclusive de atores políticos. Por parte do governo isso foi refletivo, por exemplo, no plano Brasil Maior, mas também em outras iniciativas. São pontos que trazem impactos de grande significado e que têm desdobramentos. Mais do que isso, acho que foi emblemática a postura.

No posicionamento houve uma evolução, por exemplo, da Finep. É um processo que obviamente não terminou e já vinha em um crescimento, com uma mudança de foco de "academia" para "academia mais empresa", não apenas da geração de conhecimento, pegando o processo todo de inovação.

De um modo geral, 2011 confirmou essa tendência que já estava acontecendo de uma mudança de eixo, de foco, não no sentido de uma mudança realmente, mas no sentido de complementar.

A geração do conhecimento, que continua sendo apoiada, continua sendo fundamental para todos, mas agora há essa ressonância na transformação desse conhecimento em produtos, em valor. Em 2011, nós estabelecemos um grupo de trabalho conjunto, Finep e Anpei, que se reuniu algumas vezes durante o ano e que foi extremamente produtivo.

Sobre pontos negativos para o cenário da inovação, o que a Anpei destaca?

Há um aspecto que eu considero negativo em 2011, que atrapalha bastante e é um assunto que teremos que trabalhar nos próximos meses, que foi a Instrução Normativa nº 1.187 da Receita Federal.

Essa IN era uma demanda nossa. A Anpei, juntamente com a Fiesp [Federação das Indústrias do Estado de São Paulo], montou um grupo de trabalho de discussão com a Receita e o MCTI. Nesse sentido foi bom, porque nós pudemos discutir com a Receita e trazer os pontos de vista desses atores, das empresas.

Ocorre que a Lei do Bem representa uma renúncia fiscal por parte do governo que segue alguns procedimentos. E essa lógica está representada na lei e na regulamentação. A IN é o entendimento da Receita com relação a esse marco legal.

Um exemplo é que, pelo seu investimento em inovação, a empresa pode descontar uma parte do lucro bruto e com isso ter uma redução do imposto pago. Se a empresa tem um investimento em uma equipe de 100 pessoas, que representa "x" milhões de reais de investimento por ano, esse investimento pode ser abatido anualmente e haverá uma redução do imposto devido.

Mas a dúvida é se a área de apoio administrativo está dentro da área de P&D ou não, e a legislação não vai nesse detalhe. A equipe de P&D pode ser considerada nesse mecanismo, mas a Receita disse que o pessoal administrativo não é considerado - como secretária, pessoal da área de patentes, entre outras.

Nessa questão, o tratamento ainda tem um viés um pouco acadêmico, porque na academia a parte administrativa já está considerada automaticamente. Mas no caso da empresa é realmente um ônus, que penaliza a atividade de inovação. O entendimento da Receita é que essas atividades não fazem parte das atividades estimuláveis e com isso nós temos uma redução importante.

De que maneira isso influencia as estratégias de interação comuns dentro do processo de inovação?

Nós operamos muito hoje em um sistema de "inovação aberta", é bonito, todos falam, incentivam, estimulam, encorajam, e está no discurso de todos - academia, governo e empresas. É outra forma de fazer pesquisa.

Hoje não se faz mais pesquisa como se fazia há 10, 20 ou 30 anos. Não há equipe de P&D que faça toda a pesquisa internamente. Ninguém mais tem isso, mesmo os grandes. As operações, as transações, as negociações de tecnologia e de desenvolvimento conjunto ficaram mais complicadas, mais difíceis.

Se eu contrato um P&D com alguém, eu não posso ter o benefício nessa contratação, pois esse não é um dos itens que eu possa ter o benefício fiscal; só em alguns casos, como de universidades, uma pequena empresa, uma ICT ou afins.

Nossa sugestão era de que isso fosse generalizado, pois quem está correndo o risco pela atividade de P&D e está investindo efetivamente sou eu, e não a outra empresa; então, é razoável que eu também tenha o benefício. Há uma lógica obviamente, pois a Receita não quer que haja duplicidade do benefício, mas há formas de evitar que isso aconteça.

E obviamente a nossa proposta não era a de que houvesse duplo benefício, mas que quem efetivamente fosse o motor, o agente da inovação, deveria ter o acesso ao benefício, e não quem realiza necessariamente o trabalho de P&D.

A meta do governo federal de que os investimentos em inovação cheguem a 1,8% do Produto Interno Bruto (PIB) até 2015, sendo metade do setor público e metade do setor privado, é uma meta realista? Esse número é compartilhado pelos planos das empresas representadas pela Anpei?

A meta é oportuna, razoável, mas que precisa ser contextualizada; não é só o número em si do investimento, mas como nós recheamos esse investimento.

Uma coisa boa é que, com esse ritmo novo de evolução da Finep e com a resposta das empresas, que tem sido até além das expectativas em alguns casos, existe um apetite muito grande das empresas. Elas percebem que a inovação não é um dos elementos da competitividade, mas é "o" elemento da competitividade.

Depois daquele período de substituição das importações e tudo mais que nós vivemos, hoje a competição - que é muito mais intensa, com países como Índia, Rússia, África do Sul e China - só pode se dar por meio da diferenciação, e diferenciação é inovação. Se não tivermos um foco muito grande em inovação, não vamos conseguir manter competitividade de modo perene, estrutural.

A competitividade estrutural vem somente por meio da inovação. Um ponto fundamental é que o Brasil tem que ter competitividade para inovar. Hoje, a inovação não é competitiva no Brasil. Nós temos problemas, e falando dessa forma é um pouco forte, mas temos que fazer as provocações que tenham ressonância.

O Brasil tem limitações hoje para que a atividade de inovação seja competitiva. O Brasil não tem competitividade para investir, pela taxa de câmbio, pelos juros e por todos os fatores macroeconômicos que dificultam o investimento no País.

Inovação é investimento, e tudo que se fala de investimento, se aplica também à inovação, como custo Brasil, questão trabalhista, etc., com algumas questões adicionais, como a mão-de-obra. Nós temos uma deficiência de recursos humanos de alto nível, com alta qualificação ou altíssima qualificação, que façam P&D e inovação de alto nível. O Brasil tem até bons pesquisadores em alguns casos, mas não necessariamente empreendedores e inovadores. Na academia e nas empresas, nós acabamos formando pesquisadores e esse aspecto da inovação efetivamente muitas vezes é deficiente.

Há algumas oportunidades e o governo está trabalhando nelas, como essa iniciativa do programa Ciência sem Fronteiras. É uma iniciativa extremamente bem-vinda que acho que será muito interessante para nós.

Há uma cobrança grande para que as empresas brasileiras invistam mais em inovação, a exemplo do que acontece na maioria dos países desenvolvidos. Mas há um ambiente favorável para que isso ocorra atualmente?

Falta um ambiente mais favorável e uma condição mais favorável. A briga da Anpei é justamente essa de trazer o maior número possível de empresas, porque uma isoladamente não consegue inovar. Isoladamente ela inova por algum tempo, mas é fogo de palha, não decola.

Nós precisamos estruturar a inovação nas cadeias produtivas; o discurso e a prática da Anpei são de estimular a inovação cada vez mais nas cadeias e ter um número maior de empresas inovando ajuda e alavanca a inovação das empresas que hoje já fazem inovação.

São poucas as empresas que efetivamente inovam no Brasil e nós temos que trabalhar para que cada vez mais haja mais empresas, mas não é um passe de mágica.

Eu cito o exemplo de São Paulo. Porque nós em São Paulo temos um nível de investimento em P&D num patamar da OCDE [Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico], e a participação das empresas é de mais de 60%. Porque aqui temos um ambiente mais favorável, tanto do ponto de vista da inovação em si, quanto da demanda, ou seja, o mercado pede, ele é competitivo e demanda essa inovação. As empresas ou fazem essa inovação ou estão fora. Temos que brigar para criar essa mesma condição.

Não estou citando como exemplo São Paulo dizendo que temos que fazer o que se faz aqui nos outros Estados, mas é considerar que é um processo, e que temos que criar esse ambiente favorável efetivamente, para que as empresas incorporem esse conhecimento e consigam transformar em inovação.



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